Então, eu fui agraciado com uma catapora em plenos 26 anos
de idade. Sim, eu nunca tinha pegado quando eu era criança, a minha infância na
cúpula de cristal me privou disso. E agora, peguei, e espero que esse papo de
só se pegar isso uma vez na vida seja verdade, porque é o tipo de doença pé no
saco que só é suportável pegar uma vez mesmo, porque se tiver uma segunda, pode
fazer meu óbito!
Foram 15 dias numa clausura total em que, mais do que nunca,
eu tive que lidar com o “vazio”. Chega uma hora que nem todas opções de
entretenimento disponíveis são satisfatórias, tu não tem mais saco de ver TV ou
ler, e se tu ficar puto da cara com alguma coisa tu nem para onde correr, porque
tu corre o risco de levar uma bala na testa se tu sair na rua, e ser confundido
com um zumbi putrefato! Porque foi com isso que eu fiquei parecido!
Sabe, não sei dá para me chamar de narcisista e nem afrmar
que sou completamente desapegado da aparência... Também não sei dá para me
chamar de lindo, mas de feio também é demais, o que interessa é que eu estou em
melhor forma física do que na minha adolescência. Para ter uma ideia, o retrato
mental que tenho de mim aos 14 é um piá gordinho, com umas “bolotas” no cabelo
ruim, e usando uma calça marrom de um tecido que parecia muito com um carpete –
e até hoje eu me questiono onde minha mãe encontrou item de vestuário tão
requintado! Afinal, eu dou sim algum valor para a aparência, e tu também dá! Sair
da catapora com algumas craterinhas no rosto e manchas escrotas pelo resto do
corpo foi uma coisa que abalou minha auto-estima – que sempre foi meio frágil!
Eu demorei bastante para me acostumar com uma cicatriz no queixo e deixar de
enxergar ela bem maior do que realmente era, e sei que acontece o mesmo com
esses ABISMOS GIGANTESCOS SEM FUNDO que estou no rosto, e vai levar um tempinho
para ver essas marcas com a importância que realmente têm, nenhuma. Mas anda
díficil me olhar no espelho nos últimos tempos e me sentir confortável com o
que vejo...
Nesse tempo em quarentena eu tive um sonho onde morava em um
cemitério, e eu tinha que enterrar alguém e fazer o túmulo e tudo mais... No
final, o túmulo ficava uma bosta e eu ficava muito incomodado com aquilo, porque
tava tudo torto e feio, e eu decido procurar o “coveiro oficial” para da um
jeito naquilo. Uma pessoa com quem costumo conversar sobre os meus
acontecimentos oníricos, ponderou se essa cena não teria a ver com a
importância desnecessária que às vezes eu dou para minha aparência, e se esse
episódio no sonho não dizia a respeito da “superficialidade das coisas”,
porque, no fim das contas, o morto estava enterrado, o túmulo feito, trabalho
realizado, e o que contava já tinha se obtido... Enfim, reflita!
Eu sei que não são as CRATERAS da catapora que me fazem
sentir feito, são outras questões, bem mais complexas... O fato é que essa
catapora e todas as feridinhas físicas típicas da doença que brotaram por todo
meu corpo, e me fizeram passar esses dias trancado comigo mesmo, com o vazio, com
o tédio, com a feiura, foi propício para brotar muitas outras feridinhas
emocionais latentes também... E aí é aquele negócio, tem todo o tempo que leva para
cicatrizar completamente, e às vezes ficam marcas...
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